A
SUPREMA REALIZAÇÃO
(2ª Parte)
Rodolfo Domenico Pizzinga
Informação Preliminar
Este estudo se constitui da 2ª parte de um conjunto de fragmentos garimpados e eventualmente comentados na obra A Suprema Realização, de autoria de Jiddu Krishnamurti, que reúne o essencial de algumas palestras realizadas pelo grande pensador, na Índia, em 1965, nas quais ele abordou temas de crucial importância como: só a mente lúcida vê o real, o poder do amor, a virtude do silêncio, uma diferente maneira de viver, vida criadora, urge que nos transformemos, morrer para o passado etc.
Breve Biografia
Jiddu Krishnamurti
Jiddu Krishnamurti (Madanapalle, 11 de maio de 1895 – Ojai, 17 de fevereiro de 1986) foi um filósofo, escritor, orador e educador indiano. Proferiu discursos que envolveram temas como revolução psicológica, meditação, conhecimento, liberdade, relações humanas, a natureza da mente, a origem do pensamento e a realização de mudanças positivas na sociedade global. Constantemente, ressaltou a necessidade de uma revolução na psique de cada ser humano, e enfatizou que tal revolução não poderia ser levada a cabo por nenhuma entidade externa seja religiosa, seja política, seja social. Uma revolução que só poderia ocorrer através do autoconhecimento, bem como da prática correta da meditação do ser-humano-aí-no-mundo liberto de toda e qualquer forma de autoridade psicológica.
O cerne dos seus ensinamentos consiste na afirmação de que a necessária e urgente mudança fundamental da sociedade só poderá acontecer através da transformação da consciência individual. A necessidade do autoconhecimento e da compreensão das influências restritivas e separativas das religiões organizadas, dos nacionalismos e de outros condicionamentos foram por ele constantemente realçadas.
Fragmentos Krishnamurtianos
Enquanto o ser-humano-aí-no-mundo não for livre da sociedade, livre dos padrões psicológicos que ela lhe impôs, será apenas uma entidade moral, quer dizer, muito ordeiro no sentido social, porém, desordenado no sentido virtuoso. O ser-humano-aí-no-mundo que segue os padrões morais de uma dada sociedade é imoral, porquanto se estabiliza sempre mais, e se torna mais e mais um escravo da sociedade, isto é, cada vez mais respeitável, e, por conseguinte, cada vez mais medíocre. Precisamos, definitivamente, aprender a estabelecer corretas relações e mutuamente cooperar, não mediante uma idéia, um padrão ou uma autoridade, mas, com afeição, amor e inteligência.
— Sou medíocre, sim senhor;
sou medíocre porque gosto.
Mas, acabei virando doutor
e, por aí, só ando bem-posto.— Oh!, benfazeja sociedade
que me oportunizou ser rico.
Já pensou se, na minha idade,
ainda tivesse que usar penico?— Nada tenho o que reclamar:
saí do zero e cheguei a mil.
Eu só tenho o que comemorar
pelo céu que, pra mim, é anil.— Por isto vou sempre à missa,
e, rendido, agradeço ao Senhor.
E só tem aumentado a mantissa,
e cada vez brilha mais a cor.— Dizem até que fui escolhido,
e que eu serei arrebatado.
Espero, no céu, ser recebido,
e perto de Deus ficar sentado.— Sei que foi o Senhor Deus
que fez a vastidão sem-fim,
que deu premoção ao Uraeus1
e que deu esta vida a mim.— E você? Conseguiu brilhar
ou não passou da cepa torta?
Deu um jeitinho de se arrumar
ou culpa a sogra que está morta?— Eu vou muito bem, obrigado,
e não pretendo mudar nadinha.
Estou ótimo com o meu fado,
e nunca mais comi quentinha.
Se, por exemplo, não tivermos a capacidade de apreciar a admirável forma de um ramo de uma árvore ou de uma folha ou a nudez da árvore durante o inverno, se não formos capazes de apreciar a beleza do pôr do Sol ou se, também, não estivermos em comunhão total com a sordidez que virmos ao redor de vós, ou se, ainda, não formos capazes de nos regozijar com o crepúsculo vespertino e com uma palmeira espelhada na água, então, nossa mente está embotada, ainda que sejamos muito morais, respeitáveis e obedientes aos preceitos sociais. Uma mente nestas condições nunca poderá ser livre. [A Regra Cósmica é: ou unimultifraternidade categórica ou mórbida escravidão. A Guerra Russo-ucraniana é uma forma dantesca de escravidão. A Guerra Israel-Hamas é outra forma diabólica de escravidão. O
trumpiano é uma terceira forma medonha de escraqvidão. A tentativa de golpe de Estado, no Brasil, e o Plano Punhal Verde-amarelo são, igualmente, formas pavorosas de escravidão.]
Desejo é apetite não satisfeito. O desejo é isto: um apetite a que se não soltaram as rédeas. E a sociedade diz que devemos conter, reprimir, guiar, controlar ou sublimar o desejo! O lado religioso da sociedade diz: “Praticai várias formas de disciplina; reprimi-vos a fim de achardes Deus; sede celibatário; ide para um convento; cumpri vossos deveres, mas, controlai sempre vossos desejos!” Desta maneira, implanta-se na psique, no ente humano, essa contradição, essa existência dupla: o desejo que quer se preencher, que está a batalhar, a ferver, a ansiar, e, por outro lado, a sanção religiosa e social a dizer que devemos nos conter, nos controlar, nos reprimir e sublimar o desejo. E, assim, nasce a contradição. [Contradição
Prisão.]
Contradição
De maneira geral, acontece que sub-repticiamente, secretamente, na moita, inevitavelmente, iremos satisfazer os nossos desejos, malgrado a nossa sociedade e, por conseguinte, aumentar a nossa contradição e aumentar a nossa frustração! [Independente da sociedade, enquanto não os compreendermos plenamente, sempre e a qualquer custo, haveremos de satisfazer os nossos desejos, as nossas cobiças e as nossas paixões.]
Para podermos Escutar Ilimitadamente, será necessário haver aquela Afeição, aquela Chama que destrói o passado, [as nossas prisões e os nossos grilhões]. O Amor está sempre no presente; não é uma lembrança. [O Amor esteve, está e estará sempre no Eterno Sempre.]
O Amor nascerá naturalmente, como a Compaixão, quando o problema da existência – o medo, a avidez, a inveja, o desespero, o preconceito, a esperança – for compreendido e resolvido. O homem ambicioso é incapaz de Amar. O homem apegado à família [ou ao que quer que seja] não poderá ter Amor no Coração. Portanto, o Amor implica a mais ampla liberdade, mas, não para cada um fazer o que bem entender. Todavia, o Amor só virá quando a mente estiver muito silenciosa, desinteressada e não concentrada em si própria.
Se não tivermos Amor no Coração, não importa o que fizermos – sair em busca de todos os deuses possíveis e imagináveis, nos entregar a toda espécie de atividade social, tentar melhorar as condições de vida dos pobres, reformar a política, escrever livros, compor poemas – seremos entes humanos mortos, [e tudo o que fizermos, inevitavelmente, acabará em morte, porque, inconscientemente, estaremos praticando Magia Negra]. O pior é que, sem Amor, os nossos problemas crescerão e se multiplicarão ilimitadamente. Mas, por outro lado, com Amor, poderemos fazer o que quisermos, sem receio de perigo ou de conflito, porque o Amor é a essência da Virtude, [e é sempre construtivo, nunca destrutivo]. Portanto, a mente que não se acha em “Estado de Amor” absolutamente não é Religiosa. Só a Mente Religiosa estará livre de todos os problemas e conhecerá a Beleza do Amor e da Verdade.
Você já reparou que muitos de nós são tão feios na morte como o foram em vida? Certamente, não somos como a trepadeira Glória Matutina (Morning Glory), cuja flor é de um extraordinário azul-pálido ou de um roxo-escuro com leves toques de lilás ou, ainda, de um branco peculiar. Elas desabrocham ao amanhecer e, passadas poucas horas, morrem. Na morte, são quase tão belas como em vida. Vicejam umas breves horas e deixam de existir; e, na morte, não perdem sua natureza de flor.
Glória Matutina (Morning Glory)
Estamos quase só em contato com idéias e não com fatos. A maioria de nós vive com idéias, com fórmulas, com conceitos, com a memória; e, por isto, nunca entramos em contato com coisa alguma. As explicações, as conclusões, as opiniões, as crenças, os conceitos e os símbolos absolutamente nada têm em comum com a realidade – a realidade do tempo, a realidade do sofrimento, [a realidade da Vida], a realidade da morte e a realidade do amor. Qualquer idéia impede de entrar direta, íntima, concretamente em contato com uma coisa. [E assim, construímos uma idéia de deus e vivemos de acordo com ela, acreditando em um deus onipotente, oniparente, onissapiente e onividente que ama, odeia, julga, pune, premia e faz milagres.] Definitivamente, temos de viver esta vida; a vida futura não nos interessa. Em verdade, vivemos atormentados, angustiados, em conflito etc., em contato com idéias e não com fatos, e nunca estivemos em contato com a própria
Será possível que a mente se liberte do tempo marcado pelo relógio? Será possível que a mente entre em contato com o Tempo que não se mede pelo relógio? [Tempo que não se mede pelo relógio =
]
Vivemos com o passado, em conflito com o presente, que cria o amanhã. [Ou mudamos este estado de coisas ou teremos jogado a nossa encarnação educativa no lixo, em uma espécie, digamos assim, de lastimável encarnação deseducativa.]
Lastimável Encarnação Deseducativa
É o passado nos molda o pensamento, as atividades e as perspectivas, e, desta maneira, condiciona o futuro. Servimo-nos do tempo como meio de evoluir, de realizar coisas, de mudança gradual. Servimo-nos do tempo porque somos indolentes. Porque não encontramos o meio de nos transformarmos imediatamente ou porque temos medo da mudança imediata e de suas conseqüências. Por conseguinte, servimo-nos do tempo como meio de adiamento, como meio de gradual realização e como meio de mudança.
De fato, o tempo é produto do pensamento. Se não pensássemos no amanhã ou se, em pensamento, não voltássemos ao passado, estaríamos vivendo agora. Não haveria futuro nem passado, e estaríamos vivendo completamente para cada dia, dando a cada dia a nossa atenção, vivendo com plenitude e riqueza. Como não sabemos viver o dia de hoje de maneira completa, total, plena, ardorosa e promovendo uma completa transformação em nós hoje mesmo, inventamos a idéia do amanhã.
A menos que compreendamos a natureza do medo e dele nos libertemos totalmente, nossos deuses, nossas fugas e nossas variadas atividades sociais nada significarão, porque seremos sempre seres humanos destrutivos, e não poderemos dissolver o medo. Uma mente neurótica, com seus inúmeros temores, em tudo o que faz – por mais apta que seja – está sempre introduzindo em sua ação o germe da destruição, o germe da deterioração, porque sua ação sempre será fuga ao fato. E, desta forma, a nossa religião, o templo, deus, o nacionalismo, o devotamento a um partido político e as fórmulas que temos se tornam mais importantes do que a dissolução do medo. Se vivermos com medo, do que quer que seja, estaremos desperdiçando a nossa vida, porque o medo traz a escuridão.
Só quando a mente ficar livre de todos os temores, tanto dos temores secretos, como dos manifestos, aqueles que estamos conscientes, poderá olhar essa coisa que se chama sofrimento. E o sofrimento impede, entre outras coisas, que se manifestem a compaixão, a afeição e o amor. [Na realidade, o sofrimento impede que se manifeste tudo.]
Para pormos fim ao sofrimento será necessário entrar em contato com esse extraordinário sentimento, sem autocompaixão, sem opiniões, sem fórmulas, sem explicações. Precisaremos entrar diretamente em contato com o sofrimento, assim como nos pomos em contato com uma mesa, ou seja, afastar as idéias e entrar diretamente em contato com os fatos.
Sabemos que há a morte. Por isto, inventamos a vida futura, [que nem sabemos exatamente como é nem como será.] Ficar pensando no futuro, na próxima vida e na reencarnação são fugas ao fato de que existimos hoje, fugas ao contato com a morte. [Ainda que a morte, como fim, como zero, como buraco negro, não exista.]
O que tem verdadeira importância é o que somos agora, hoje. Porque o que somos agora, hoje, irá condicionar o nosso futuro. Assim, o que somos, o que fazemos, o que pensamos, o que sentimos e como vivemos é de ilimitada relevância. Mas, para Vivermos digna, equilibrada e ajustadamente, deveremos compreender a Morte. Mas, para compreendermos a Morte, teremos de Morrer. [E Morrer significa Morrer hoje, de maneira fácil e feliz, sem discussão e sem explicações, para todas as coisas do passado, Morrer para os prazeres do presente e Morrer para as esperanças do futuro.]. Então, ou Morremos para tudo isto agora ou, inevitavelmente, morreremos quando chegar a Hora. Enfim, o ser-humano-aí-no-mundo Religioso é aquele que Morre todos os dias e Renasce todos os dias. Sua mente é sempre nova, inocente, vigorosa, pois, Morreu para os seus sofrimentos, Morreu para os prazeres, Morreu para as coisas que abrigava secretamente no Coração.
— Eu nunca quis
morrer nem Morrer.
E morto-vivo vivi.
Então, soou a Hora,
e, sem ter Morrido
e tão-pouco Vivido,
eu tive que morrer.
Um fato, qualquer que seja, precisa ser compreendido, e não o compreenderemos se nos retirarmos para o Himalaia e nos enclausurarmos para fugir ao fato [conflito]. O fato deve ser transformado sem esforço. Ao começarmos a fazer esforço, a batalhar ou a lutar contra ele, começaremos a torcer a nossa mente, a embotá-la, a insensibilizá-la, a cansá-la e a torná-la estúpida e completamente insensível. Para Viver, temos de ser sobremodo sensíveis a tudo O-QUE-É e à própria Natureza – à beleza, à fealdade, à brutalidade, à sordidez, à imundície das ruas da cidade, às nuvens que vemos numa certa tarde resplendentes da luz solar, ao reflexo sobre as águas, a um bonito rosto, a um belo sorriso. Precisamos aprender a ser sensíveis à própria Essência da Vida. E esta sensibilidade só poderá vir se não julgarmos, se não preconceituarmos, se não condenarmos, se não reprimirmos, se não traduzirmos, se não interpretarmos, se não controlarmos, se não identificarmos, se não avaliarmos, se não justificarmos ou se não explicarmos os fatos, os conflitos e as coisas. Isto significa olhar sem interferir, sem fazer esforço algum. Isto significa existência sem esforço e, por conseguinte, uma vida altamente sensível, altamente inteligente. Todo atrito, toda luta e todo espaço destroem a sensibilidade da Mente e o sentimento do Coração. O oposto disto se resume em um estado de verdadeira Afeição e de grande Amor, em que nunca existe conflito algum.
Considere bem isto: O Observador (o Pensador) só existe quando há a idéia de transformar o pensamento, de reprimi-lo, de alterá-lo, de dominá-lo, de controlá-lo. Só quando existir alguma atividade a respeito do pensamento, poderá existir o Pensador. Mas, quando essa atividade se detém inteiramente, só há, então, pensamento, e não há nenhum Observador a pensar. E quando se observa desta maneira, pode-se ver que, na observação, o pensamento passa por uma revolução fundamental, e, por conseguinte, a vida e a existência se tornam tais, que não há mais contradição na ação. Isto não é um ideal, porém, uma coisa que cumpre a todos nós alcançar.
— Eu vi e julguei.
Julguei e condenei.
Condenei e separei.
Julguei a mim mesmo.
Condenei a mim mesmo.
Separei a mim mesmo.
O que é a Vida? A Vida é ação. Não diferentes ações, em diferentes níveis, em contradição uns com os outros, porém, uma atividade total, como existência, como movimento.
A DISCIPLINA, no sentido original da palavra, não implica ajustamento, repressão, imitação, porém, antes, é um processo de aprender. E o aprender não é mera acumulação de conhecimento, coisa de que qualquer máquina é capaz. Máquina nenhuma é capaz de aprender; mesmo o computador é incapaz de aprender. Os computadores só podem acumular conhecimentos, informações, e nos fornecer. O ato de aprender, pois, é ato de disciplina – de Aprender a Escutar em Silêncio [ou de Escutar o Silêncio]. Enfim, só a mente que está aprendendo [em Silêncio] é uma Mente Apaixonada.
Fiquei no barulho
e continuai na mesma.
Insisti no barulho
e na mesma continuei.
Entrei no Silêncio,
ouvi a 'Voz do Silêncio',
e descobri quem EU-SOU.
Aprender é uma das coisas mais difíceis, porque todas as nossas tradições, todo o passado, todo o conjunto de lembranças e toda a montanha de hábitos fixaram a nossa mente em uma rotina, que estamos absolutamente dispostos a seguir, e de modo nenhum desejamos ser perturbados e atraídos para fora dela. O ser-humano-aí-no-mundo que ficou cativo na estrutura da respeitabilidade, da repressão, da imitação e do ajustamento compulsório não está vivendo, absolutamente; tudo o que aprendeu e tudo o que adquiriu são meros amoldamentos a algum padrão.
Modern Times (1936)
Para aprender alguma coisa, seja lá o que for, é preciso haver intensidade, paixão.
Aprender, não é ceder nem rejeitar. Começa o aprender no momento em que se compreende que todo esforço de repressão, de rejeição e de controle impede o aprender.
Reprimir ou rejeitar o prazer não resolve o problema. Os indivíduos chamados “religiosos” refreiam toda forma de prazer – pelo menos eles tentam – e o resultado é que se tornam entes humanos embotados e inanes. A mente deles é árida, entorpecida, insensível e totalmente incapaz de compreender o real.
Para aprender, a nossa mente deverá estar disposta a investigar, ser apaixonada, ardorosa e, por conseguinte, nova.
Os problemas da vida precisam ser compreendidos e resolvidos. De outro modo, a nossa mente continuará escravizada a um hábito e a uma rotina, e se tornará embotada, estúpida e lerda. Quando, intelectualmente e emocionalmente estamos asfixiados, nossa mente só é capaz de repetir, de copiar e de imitar o que outros disseram ou fizeram, e nos tornamos indigentes, vazios e embotados, pois, entra dia sai dia, fazemos sempre a mesma coisa, e o que quer que façamos é sempre e só a mesma repetição.
— Repeti...
Fingi...
Reproduzi...
Imitei...
Copiei...
Plagiei...
Não vivi...
E morri...
Como um alien-saci!
Ao negarmos a emoção, estaremos negando a sensibilidade, e negando a sensibilidade estaremos negando a beleza, e negando a beleza acabaremos nos tornando espiritual e mentalmente embrutecidos e indigentes.
Cada problema que surge em nossa vida, por mais complicado, difícil e trabalhoso que seja, deverá ser resolvido no mesmo dia e no mesmo instante em que surgir. Isto é importantíssimo. A mente que deixa um problema criar raízes se torna insensível, medrosa, feia, interessada só em si mesma, egocêntrica e brutal.
Para resolver o chamado “problema do sexo”, é necessário compreendê-lo inteligentemente – sem dele fugir, sem reprimi-lo, sem fazer um certo voto idiota e, também, sem ceder. Para isto, primeiro, é necessário compreender o problema do prazer. E, para isto, precisamos libertar a nossa energia, não mediante a repressão, não mediante a identificação com uma certa idéia. Precisamos libertar a energia em todas as direções, de modo que, estética e intelectualmente, a nossa mente se mantenha ativa, racional, lúcida e percebendo as coisas que são e como são. Quando não percebemos nem sentimos a beleza de uma árvore, a beleza de uma ave que voa, a beleza da luz refletida na água e a beleza de tantas outras coisas da vida, quando de nada disso estamos cônscios, o que resta? Como válvula de escape, resta o sexo. Portanto, precisamos compreender-resolver o problema da existência – o medo, a dúvida, a avidez, a inveja, o preconceito, o desespero, a esperança – porque enquanto não o resolvermos seremos incapazes de Amar, o que significa e implica na mais ampla Liberdade, o que só acontecerá se e quando a mente estiver muito silenciosa, desinteressada e não concentrada em si mesma.
Na verdadeira comunicação, não só temos de ver com os olhos e ouvir com os ouvidos, mas, também, ver e sentir com a Mente e com o Coração, porque com a Mente vemos muito mais e mais rapidamente do que com os olhos e ouvimos com mais presteza e mais precisão do que com o ouvido. E, para sentir, temos de ver e ouvir não só com a mente, mas, também com o Coração.
Vendo, Ouvindo e Sentindo
(Animação Simbólica)
Quando aceitamos ou rejeitamos o que vemos e o que ouvimos não há comunhão. Mas, temos de estabelecer a comunhão (inexistência de separação mental ou emocional). Se houver ambição e competição não poderá haver comunhão.
Não poderemos nos aproximar e compreender o que quer que seja com convicções 'a priori', opiniões 'a priori' e juízos 'a priori'.
Não importa se a tradição (costume ou hábito que moldaram a nossa mente) é “boa” ou “má”; o fato é que a tradição condiciona a mente. Portanto, preste muita atenção: a meditação não é oração, não é repetição de palavras, não é a prática de um determinado método ou sistema, sob a égide de uma certa autoridade. Se prestarmos atenção a este fato, nunca mais recorreremos a estas coisas, pois, nos tornaremos, então, completamente responsáveis perante nós mesmos. Por conseguinte, não teremos gurus e não dependeremos de ninguém. Responderemos, então, por tudo o que fizermos. O autoconhecimento de nós mesmos é a única base de onde deveremos e poderemos partir. Para podermos achar Deus [o Deus de nossos Corações], deveremos, quanto antes, nos alforriar da autoridade de qualquer tradição [religiosa, política, social, familiar etc.]
A paz nunca é estática; é uma coisa viva. A paz só virá quando se compreender toda a luta do homem, não uma dada luta, em particular, porém, a totalidade da existência do homem, seu trabalho, seus sentimentos, suas ambições, seus apetites sexuais, seu espírito de competição, seus desesperos e seus preenchimentos e todo o seu vasto e complexo sistema de fugas. Se tudo isto compreendermos, desta compreensão nascerá a paz. Mas, se seguirmos um método ou um sistema que nos prometam ou nos garantam a paz, esta paz será, então, uma mera idéia, um conceito estático, sem nenhuma realidade.
Para o que quer que seja, sem exceção, é inútil pedir socorro a quem quer que seja. Qualquer pedido de socorro é uma fuga. Para termos paz, por exemplo, deveremos viver pacificamente, quer dizer, sem ambição, sem competição, sem nacionalismo, sem divisões de classe e sem as desprezíveis divisões de raça, de país e de língua. Para vivermos pacificamente, deveremos estar em paz conosco [com os outros e com tudo]. E se, em primeiro lugar, não pudermos estar em paz com nós mesmos, é inútil rezar pela paz, pois, tudo o que fizermos gerará desordem e conflito. Eis por que deveremos ter abundante autoconhecimento. Enriquecer-nos do conhecimento de nós mesmos é a única base de onde poderemos e deveremos partir. E isto, simplesmente, significa estar cônscio, sem condenar, sem comparar, sem dizer “aquilo é bom”, “aquilo é mau”, “aquilo é bonito”, “aquilo é feio”, “conservarei, isto”, “não conservarei aquilo”, sem explicar, sem justificar, enfim, sem avaliar e sem julgar – simplesmente cônscio, sem escolha das coisas exteriores, e todo o campo da consciência começará a se revelar.
Se começarmos a observar atentamente tudo o que nos cerca, nos tornaremos altamente sensíveis. Se “escutarmos” e percebermos não só o mundo externo, os sinais externos, mas, também, a “mente interior” que olha e sente, constataremos que, neste percebimento sem escolha, não há esforço algum. [Então, paradoxalmente, mas, só aparentemente, lutar o Bom Combate, é lutar sem esforço. E lutar sem esforço é não desejar absolutamente nada. Este é o que se poderia denominar de Desapego Iniciático.]
— Sem escolher, percebi.
Sem me esforçar, senti.
Em silêncio, ouvi.
E, ouvindo, renasci.— Meu ego se contraiu.
Meu Manipura dormiu.
Minha Rosa se abriu.
Meu Dia se coloriu.— Então, pude captar
o Eterno Som, no ar,
e, aí, me Libertar,
e, ciente, me Elevar.— Pronto, Eu-estou.
Peregrino, Eu-vou.
Humilde, Eu-sou.
Serviço, Eu-dou.— Eu nada quero.
Eu nada espero.
Eu nada acelero.
Eu nada altero.— A Regra: Bondade.
A Divisa: Piedade.
O Sempre: Verdade.
A Lei: Unicidade.
Quando a pessoa está a querer e a buscar mais, isto indica que não compreendeu a estrutura de seu próprio ser. Se não nos compreendermos, se não lançarmos a base correta, a única base válida – que é a compreensão de nós mesmos – poderemos fazer o que quisermos, nos sentarmos em qualquer postura que seja, nos pormos de pernas para o ar apoiados na cabeça, repetirmos palavras e mantras, seguirmos um instrutor, poderemos, enfim, fazer o que quer que seja, todavia, jamais encontraremos a paz e jamais alcançaremos o que é verdadeiro. Sem a compreensão de nós mesmos, não há conduta virtuosa. Sem autoconhecimento, todas as nossas ações causarão conflito, aflição, dor e confusão. Sem nos compreendermos, não importa o que fizermos, não haverá Sabedoria. Só quando compreendermos a nós mesmos, poderemos receber a Mensagem da Vida.
Quem vive na base de uma teoria, é um ser-humano-aí-no-mundo morto, pois, está vivendo com idéias, mas, não com fatos.
A mente que toma disposições para meditar não medita, porque o seu meditar é uma ação deliberada. A ação deliberada, visante a um certo resultado ou ganho, denuncia um desejo, uma ânsia de fugir ao fato da vida de cada dia. Por conseguinte, a mente que deliberadamente pratica a meditação não alcança o estado de meditação, por mais que se esforce. Assim sendo, não deve haver nenhum ato deliberado de meditação. Se há ato deliberado de meditação, este ato se torna esforço e, por conseguinte, uma pressão sobre a mente. A meditação, pois, não é um ato deliberado, não é uma continuidade. Porque, no momento em que tem continuidade, adquire um “valor temporal”, e se torna, portanto, um ato criado pela mente como meio de alcançar algo ou de conservar algo. Para ser ou se tornar sensível, o cérebro deverá estar em silêncio, não influenciado por nenhum gosto e por nenhuma aversão.
— Meditei para silenciar,
mas, não silenciei bulhufas.
Meditei para me apaziguar,
mas, não me apaziguei bulhufas.
Meditei para alcançar,
mas, não alcancei bulhufas.
Meditei para conquistar,
mas, não conquistei bulhufas.
Meditei para poder enricar,
mas, não enriquei em bulhufas.
Meditei para ficar + potente,
mas, não potencializei bulhufas.
Meditei para ficar + charmoso,
mas, não charmoseei bulhufas.
Meditei para ficar + inteligente,
mas, não inteligenciei bulhufas.
Meditei para poder subjugar,
mas, não subjuguei bulhufas.
Meditei para poder acabar,
mas, não acabei com bulhufas.
Meditei para transformar,
mas, não transformei bulhufas.
Meditei para poder escutar,
mas, não escutei bulhufas.
Meditei para poder contatar,
mas, não contatei bulhufas.
Meditei para me ilustrar,
mas, não me ilustrei em bulhufas.
Meditei para poder adicionar,
mas, não adicionei bulhufas.
Meditei para poder escapar,
mas, não escapei de bulhufas.
Meditei para poder me livrar,
mas, não me livrei de bulhufas.
Meditei para poder me curar,
mas, não me curei de bulhufas.
Meditei para poder me deskarmizar,
mas, não me deskarmizei de bulhufas.
Então, meditei sem nada almejar,
e, aí, eu pude compreender
as nossas três grandes prisões:
desejos, cobiças e paixões.
Então, sem qualquer esforço,
me livrei disso tudo.
Não nos libertaremos enquanto nossa mente estiver repleta de idéias, de crenças, de conceitos, de fórmulas, de proibições e de deveres.
Não se pratica o Silêncio; ele deverá vir naturalmente, sem esforço algum. E, quando o Silêncio chegar, não haverá mais conflitos, não teremos mais medos, não haverá mais gurus e não haverá mais tradições. Seremos entes humanos vivos.
A mente que se acha em completo silêncio [SILÊNCIO] está completamente carregada de ENERGIA. E se soltarmos as rédeas desta ENERGIA, anônima, sem nacionalidade, sem conflito e que não pertence a ninguém, ela poderá nos levar muito longe, e ultrapassar os limites do espaço-tempo.
Relatividade da Simultaneidade
(A simultaneidade não é absoluta, mas, depende do referencial do observador.
O que isto quer dizer? Simplesmente, que há níveis ou graus de SILÊNCIO, e que,
portanto, nossas realizações dependerão de alcançarmos esses níveis ou graus.
Nesse âmbito, a regra fundamental é não querer nem esperar absolutamente nada.)
Continua...
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Nota:
2. Ureu (em latim: Uraeus; em grego:
; em romaniz: Oùraios; plural Uraei ou Uraeuses) é um adorno em forma de serpente usado nas coroas de deuses e faraós do Antigo Egito como símbolo de soberania. Segundo um dos Textos das Pirâmides, o Deus Gebe deu à cobra do faraó o direito de ser a mantenedora legítima do trono do Egito. Era a cobra que, segundo inscrições do tempo de Tutemés III (1479 – 1425 a.C.) e Ramsés II (1279 – 1213 a.C.), destruía os inimigos reais.
Máscara com um Ureu de Tutankhamon (cerca de 1341 a.C. – cerca de 1323 a.C.)
Disco Solar Alado (Com Dois Uraeuses Coroados)
Música de fundo:
Sinfonia nº 6 em Fá maior, Op. 68, "Pastorale": I. Allegro ma non troppo
Compositor: Ludwig van Beethoven
Interpretação: Yo-Yo Ma, Emanuel Ax & Leonidas KavakosFonte:
https://www.youtube.com/watch?v=qyr-IE8HmIs
Observação:
A Sinfonia nº 6 em Fá Maior, opus 68, de Ludwig van Beethoven, também chamada Sinfonia Pastoral, é uma obra musical precursora da música programática. Esta Sinfonia foi completada em 1808, e teve a sua primeira apresentação no Theater an der Wien, em 22 de dezembro de 1808. Dividida em cinco andamentos, tem por propósito descrever a sensação experimentada nos ambientes rurais. Beethoven insistia que essas obras não deveriam ser interpretadas como um quadro sonoro, mas, como uma expressão de sentimentos. É uma das mais conhecidas obras da fase romântica de Beethoven.
Páginas da Internet consultadas:
https://en.wikipedia.org/wiki/Spacetime
https://pngimg.com/image/42563
https://www.istockphoto.com/br/fotos/ugly-key
https://pt.vecteezy.com/arte-vetorial/9899633-icone-de-lata-de-lixo
https://pt.egypttoursportal.com/blog/egito-antigo/simbolos-egito-antigo/
https://www.newgreenfil.com/pages/a-magnifica-mascara-de-tutankamon
https://giphy.com/explore/flirting
https://www.pinterest.fr/pin/510736413966822040/
http://illustratedaliens.tumblr.com/
https://plus.google.com/+BogdanKlimowicz/posts/SP5onAeWufv
https://www.flickr.com/photos/anthony_nixon/2918216390
https://bone.haus/blueconic-animations/
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